terça-feira, 26 de outubro de 2010

Escrever para não enlouquecer



Mais um dia aqui ao teu lado. Estou na cama ao lado, ao lado do teu leito de morte e resolvi escrever, novidade nenhuma! Faço isso sempre e principalmente quando as coisas não vão bem.

Nossa mãe estava o tempo todo agarrada na tua mão, cabisbaixa. Agora foi lá fora, talvez fumar um cigarro, talvez fazer nada, não sei...Porque será que as mães ficam de cabeça baixa nessas horas? prostradas? estarrecidas?vencidas? também não sei...

Você tem 31 anos, mas na ficha do hospital está 30. Há 45 dias você tava por aí serelepe, faceira, de carro, louca de pressa, sempre com uma coisa pra fazer. Bonita, arrumada, sempre na volta da mãe. Do dia pra noite o infortúnio bateu a tua porta, as dores começaram...

Hoje a Cíntia desligou a televisão, que estivera o tempo todo ligada, como que para completar a vida que faltava nesse quarto e tudo ficou silencioso para morte poder se instalar.

Porque falar em passado agora?Você ainda está respirando. Acho que eu estou meio louca ou chapada!

Fico lembrando da gente no carnaval, de fantasia na escada do Clube. Lembro de um tempo que a gente pegou ferida na cabeça e o pai nos levou para cortar os cabelos bem curtinhos.

Meu Deus!Quanta bobagem eu penso...

Quero não perder a oportunidade enquanto respiras de dizer que eu te amo tanto, tanto, eu nem sabia, mais do que todos os que já partiram. Lembro das coisas que passaram, da Vó, do Vô que nos fazem tanta falta, pensava que tinham me abandonado, me deixado sozinha, mas agora vejo que não, eu tinha você e tínhamos umas as outras.

Droga!Já sinto a tua falta!Droga e você nem se foi ainda!

Passado e presente ficam se confundindo na minha mente, de repente vem algo que eu nem lembrava mais, coisas que já tinha dado por perdidas e mortas e agora ganham vida novamente, pode?Lembro dos dias em Rio Grande em que tu me levavas pela mão para a escola, eu tinha medo e tu me davas segurança, quem diria tu que sempre pareceu tão frágil.

Acho que tu nunca precisou de mim. Fala, tu precisou de mim algum dia? Me responde!

Lembro das tuas roupas, do teu cheiro, sempre cheirosa, correntinha no pescoço puro talco! Lembro do teu macacão cor de rosa, de suspensório e camisa branca. Ah aquela camisa branca que tu comprou naquela loja, como é o nome mesmo? Krás, sei lá! Tu adorava comprar roupas lá, diferente de mim que um all star, calça de brim e uma bolsa atravessa bastavam. Tu foi num baile do Impacto com aquela roupa lembra? Foi lá na Afaço, quando eu cai o maior tombo e morri de rir e tu morreu de vergonha.

A gente sempre foi tão diferente, tão diferente...fui deixando por conta das diferenças e opções pra te abraçar amanhã, estar contigo outro dia. Não tínhamos mais tempo. Eu e meus muitos amigos, você e seus namorados firmes.

Que quarto horroroso, eu choro em saber que terei saudades dessas paredes feias, só porque tu respirou esse ar, e até tua respiração fraquinha me é suficiente pra te ter por perto, se pudesse respiraria por ti, porque que não dá? Poderia respirar por ti...se desse...se desse...se desse...desse...esse...sse...sss

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